sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Que Deus olhe por nós

 Todos querem falar. Todos se acham no direito de falar. “Mate o bandido, prenda o político e extermine o policial corrupto”, também tem aqueles que vão além: “Esses cariocas merecem sofrer, acham que a vida é só alegria. Vamos jogar bombas no Rio de Janeiro”. É amigos, temos que recorrer a São Sebastião. Pra quem faltou na aula, preferiu ir no bar, ou simplesmente se fecha nas imagens geradas pela televisão e internet, o Rio de Janeiro nasceu assim, em meio ao caos de uma guerra entre franceses e tupinambás. É a mui leal e heróica cidade do Rio de Janeiro, linda, encantadora, maltratada, “purgatório da beleza e do caos”. Foi no meio desse caos que uma das mais fantásticas civilizações se estabeleceu. 
Aquela vida que se dá e se reiventa na rua, estabelecida a revelia de quem negava vida e cidadania ao povo. Quando porta se fechava, o direito a vida em plenitude se negava? Tome vida, vida em plenitude de troco. Soavam os tambores do samba, da capoeira, por Iemanjá, reinventava-se a vida. Na fresta, contra tudo e todos, floresceu a civilização que deu ao mundo Pixinguinha, Lima Barreto, Zico, Cartola, Machado, Mané, Noel, Zeca, Leônidas, Di Cavalcanti, Romário, Vinícius, o samba, e tantos outros gênios da raça. 
O Rio de Janeiro já passou por isso outras vezes. Pena que não existia jornalismo com helicóptero e nem tanques da Marinha. Sem isso, quase ninguém se lembra. Batalhas intermináveis forjaram um pouco dessa história. De todas essas guerras, ergueu-se uma cidade mais forte, sempre. É preciso analisar todos os aspectos dos acontecimentos de agora. Ponto por ponto, serenamente. Mas sempre com o lembrete de que não se cometa o erro do veredito definitivo. Por aqui os dados rolam sempre, e a força de uma civilização construída em bases tão fortes, com história tão monumental não se rompe assim de um dia para o outro. Bateram o martelo tantas vezes contra o Rio e sua gente. Apressados. 
“Enterre-se o futebol carioca” (quanta bobagem se falou nesses anos? Quantos programas de tv feitos para analisar o fim do futebol carioca...quanta pressa, quanta análise superficial...Como se os dramas do futebol do Rio não fossem os mesmos de todo o Brasil...Flamengo campeão ontem, Fluminense campeão hoje) “Enterre-se a cidade”. “Enterre-se a economia”. “Enterre-se esse povinho”. E lá vinha São Sebastião do Rio de Janeiro, reinventada, melhor.
Dito tudo isso, ou como diria a voz do boteco, feita a ressalva do “muita calma nessa hora”, vale pensar uma coisa sobre os acontecimentos dessa quinta-feira, dia 25.
A experiência de varrer a pobreza, o crime e o que esses governantes consideram sujar a cidade para baixo do tapete não é nova. Se alguém não conhece a história, basta ver “Cidade de Deus”. Gente varrida pra longe de seus lugares para não incomodar a zona sul e as pessoas de maior poder aquisitivo. Tal estratégia peca sempre por um detalhe: assim como os adversários esqueciam de combinar planos de marcação com Garrincha, falta sempre combinar com quem é varrido pra baixo do tapete que ele deve ficar ali. Mas lembre-se, um dia essa gente, brasileiros, se reinventam e sempre saem debaixo do tapete levando revolta e sede de revanche. 
Mas de qualquer forma, São Sebastião parece que mais uma vez olha pelo Rio de Janeiro. Porque a pasmaceira e a política eleitoreira de jogar pra baixo do tapete parece com os dias contados. Ficou exposta. Algo terá que ser mudado. Ao certo, sabemos apenas que o Rio seguirá. Como sempre seguiu. Nas ruas, na festa, na fresta, no botequim, na favela, na praia, na pelada, no futebol, na sua gente e na civilização de Cartola, Candeia, Pixinga e Noel. Que São Sebastião nos abençoe. Amém.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Eles não deveriam morrer

   As lendas deveriam ser eternas, ainda mais aquelas que mexem com nossa imaginação, principalmente quando crianças. Homens que não são comuns. Pessoas diferentes das 6 bilhões que povoam essa bagunça chamada Terra. O jogadores de futebol Pelé e Garrincha; o rei do golf Tiger Woods; os deuses do basquete Michael Jordan e Magic Johnson; o dono das curvas Ayrton Senna; a dupla que mudou no tênis Federer e Nadal; e sem menor ou maior importância, dois homens que fizeram do mar o local para um esporte viciante, Kelly Slater e Andy Irons.
   A questão aqui não é qual o seu esporte favorito, qual o mais rentável ou quem é mais conhecido. Estamos tratando de seres humanos que praticam algo, que os demais também praticam, mas que são tão bons que beiram a tal da perfeição. Muitos não viram Pelé, nem Garrincha em campo, mas conhecem as histórias, que são contadas pelos pais e avôs. Dois homens que mudaram a visão que tínhamos de um esporte que, no começo, era absolutamente elitista neste Brasil imenso.
   Poucas pessoas conhecem o golf, mas muitas já ouviram falar no negro que mudou o esporte, que até hoje, é visto como passatempo dos endi-nheirados. Tiger Woods ganhou tudo, conquistou prêmios, dinheiro e uma reputação que só foi abalada pelo vício em sexo. Mesmo assim, por ter ultrapassado tantas barreiras, é um ícone no golf e uma lenda no esporte. Falando em sucesso de negros esportistas, não se pode esquecer dos reis da quadra Michael Jordan e Magic Johnson. Ambos marcaram uma geração em um esporte que fatura bilhões por ano. O primeiro reinventou o basquete, o segundo, além de um jogador fora de série, conseguiu superar uma grave doença e continuou jogando em grande nível.
    Para falar de Ayrton Senna não precisa de muitas coisas. Um dos maiores símbolos esportivos que o Brasil já produziu. Atleta respeitado pelo talento que tinha e por sua postura. Senna era um vencedor, que após a trágica morte entrou para a galeria de lendas esportivas.
     O suíço Federer e o espanhol Nadal faz jus a seus países. O primeiro funciona como um relógio feito na Suíça, preciso e eficaz. O segundo tem um pouco do povo da Espanha. Nadal é a força e o calor dentro de quadra. Ambos já falaram que só não são os maiores de todos os tempos, pois um ainda precisa vencer mais o outro.
     Andamos em todos os esportes para chegar no surfe. Kelly Slater é o maior. É o mais completo, mais competitivo e super famoso. Perto dele, os outros surfistas somem. Mas neste mundo dominado por um único homem, apenas um ser tentou o desafiar: Andy Irons. Até aqueles que não amam o esporte das ondas precisam saber que o único surfista que fez a maior lendas das pranchas perder noites de sono foi esse havaiano, que morreu na terça-feira, dia 2, por causas ainda não conhecidas.
     Pessoas como essas, seres humanos diferentes, merecem e devem ser tratados como lendas. Fazem, com perfeição, o que nós, normais, nos matamos para fazer com a mais simples monotonia de sempre.